domingo, 31 de maio de 2009

"HISTÓRIAS DE AMOR" de JOSÉ CARDOSO PIRES




Bela escrita. Seca, dura, curta, eficaz. Segundo livro de José Cardoso Pires poribido pela censura depois de cortes inomináveis. Já aqui está presente o que fará a raiz de uma das mais belas aventuras da literatura em língua portuguesa, que viria a ter os momentos maiores em livros como “O delfim” ou “Alexandra Alpha.”

É óbvia a influência de uma certa literatura americana, sobretudo dos melhores escritores de short stories. A visualidade a dever muito ao cinema, a contenção a dar espaço ao leitor para completar a cena e desenvencilhar-se das ambiguidades cuidadosamente deixadas a pairar.

Curioso como a escrita nos situa nos anos 50 e na forma de respirar e falar desse tempo. Particularmente nos diálogos, nos gestos, nos movimentos, talvez até no discorrer do tempo da acção. Lembro-me desta forma de falar dos homens, das mulheres dos amantes. Já não a minha. Mas a que eu via/ouvia aos mais velhos e depois no cinema português da época.

São estes recantos da escrita que fazem da literatura um instrumento notável para estudarmos os anos idos e as suas pequenas histórias que são as que realmente constroem a grande História.

Curioso ainda ver o que preocupava os homens da censura nesta edição que mostra os cortes impostos pelo lápis azul. São a prova de que este país era, mais do que um estado policial, um mundo de pobreza humana, mediocridade e pequenez moral e estética.

Por fim, é muito curioso e muito próprio de Cardoso Pires a asa que, de repente, baixa sobre a dureza da posa e lhe abre uma inesperada dimensão poética, conferindo a alguns dos seus contos uma grandeza única.

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