terça-feira, 25 de maio de 2010

LIVROS DE QUE SE PRESCINDE, VOCÁBULOS DE QUE NÃO SE PODE PRESCINDIR





Há muito que me habituei a ler a “Babelia”, o suplemento semanal de “El País” que trata de livros e dos seus autores. E sempre o faço com gosto e algum proveito. Estão neste caso dois dos seus últimos números (948 e 953), os quais trazem vários artigos dignos de referência. Um deles, da autoria do escritor boliviano Santiago Gamboa, tem por título “Os livros que não acabei de ler” e fala-nos dos livros de que gostamos, mas que não precisamos de ler até ao fim. Após a leitura das primeiras dezenas de páginas, “sabemos” que o livro já não tem muito mais para nos dar. Livro que pomos de lado, adiando a sua conclusão para data posterior – que talvez nunca chegue.
Um outro artigo, da autoria de Emílio Llego (professor da Universidade de Zaragoza), tem por tema o envelhecimento lexical e a morte dos vocábulos considerados obsoletos e, por isso, eliminados dos diccionários. Artigo que é, em última instância, um apelo à preservação desses vocábulos, pois “os resíduos das palavras desactivadas dormitam sempre no fundo de nós”. Eliminar palavras, mesmo as que não são utilizadas na linguagem de hoje, constitui sempre o empobrecimento de uma língua e a perda de um património cultural que é parte integrante da história de uma comunidade. E não posso deixar de me lembrar dos livros de Camilo Castelo Branco, riquíssimo repositório de léxicos do passado, que transformam essas obras em algo de vivo – e eterno – livros cuja leitura eu nunca pude interromper, muito menos adiar para as calendas gregas.
Mas como os diccionários, quer queiramos quer não, vão sofrendo um empobrecimento progressivo, sou obrigado a ter na minha estante os diccionários, os vocabulários, os léxicos de outras épocas, pois só com o seu concurso é que consigo resolver alguns problemas de linguagem, nomeadamente quando, no meio da escrita, me surge um termo que “dormitava” no fundo de mim, mas cujo sentido se foi perdendo ou alterando ao longo dos tempos. Termo, construção verbal, de que não posso prescindir, pois, se o fizer, empobreço o meu pensamento, o meu sentir, em suma, a minha língua.

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