domingo, 15 de maio de 2011

UM ADEUS COMOVENTE



O José Oliveira da Editora Caminho entregou-me este livro como se entrega uma preciosidade a alguém que é capaz de a avaliar.

Li-o com a maior atenção, sem deixar de fazer convergir todas as memórias que guardo do Mário Castrim.

Homem de convicções muito fortes, capaz de magoar e de amar, amigo extremo e adversário extremo. Não era flor que se cheirasse, dirão. O sectário geral, chamavam-lhe. Um pai de excepção, diz a Alice Vieira, sua companheira até à morte.

Conheci-o, visitei-o no dia seguinte ao nascimento do seu segundo filho. Teria eu uns 18, 19 anos...? Fiquei comovido com a sua comoção.

Li-o dia a dia nas suas críticas de televisão no "Diário de Lisboa". Delirei, detestei, comovi-me, revoltei-me com as suas palavras, os seus elogios e as suas diatribes.

Conheço-lhe as histórias e os poemas para crianças. A sua capacidade de voar nas palavras. A sua necessidade de as ancorar às certezas da ideologia que era a sua.

Mesmo saindo pouco de casa
foi um homem do mundo. Teve uma vida com sangue a correr-lhe nas veias,. Uma vida larga, contraditória, uma vida cheia de palavras que deixou cheias de vida, ao contrário de alguns jovens poetas, também cronistas, também diversos nas suas avaliações,que só têm literatura e cotão na dobra dos versos.

Os poemas agora publicados pertencem por certo aos últimos dias de Mário Castrim. Mostram-no na solitária vulnerabilidade dos seus amores, do seu espaço, dos seus objectos, da sua casa, da sua sala de onde observava o mundo através de breves rasgões e aonde convocava pássaros, mares, navios,sonhos e a dolorosa memória da su infância.

Conheceu alguns a quem o Mário, muita vezes contra a corrente, muito corajosamente colocou na galeria do pechisbeque. Sou amigo de alguns a quem ele, injustamente, magoou.

Este livro não faz esquecer farpas e ferretes mas afasta tais memórias para nos trazer a expressão intensa de um adeus comovente.

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