domingo, 1 de janeiro de 2012

"Eu fiz-me ouvir junto de quem não perguntou por mim. Deixei-me achar por quem não me buscou.” Isaías






Diário

 (1941-1943)

Etty Hillesum

Colecção Teofanias
(dirigida por José Tolentino Mendonça)

Assírio e Alvim


Etty Hillesum, jovem judia de 27 anos, escreveu,  entre 9 de Março de 1941 e 13 de Outubro de 1942, um diário em oito cadernos. Desses escritos saiu este “Diário” breve, profundo e intenso de uma vida também breve e intensa, em tempos fatalmente trágicos que desafiaram toda a resistência humana ao sofrimento e à humilhação.  
Etty, que morreu antes de completar trinta anos, foi um espirito crente em Deus que não renegou a sensualidade do corpo nem a beleza de um mundo marcado pelo sofrimento. Toda a sua escrita é dotada de uma forte espiritualidade ancorada ao amor e à consciência do corpo, invulgares no feminino da época em que viveu.
Quando, em 1942, Etty foi enviada para o campo de concentração Westerbork (morreu, em 1943, em Auschwitz) levou consigo a Bíblia, “Cartas a um Jovem Poeta” e o “O Livro de Horas” de Rilke por quem tinha uma profunda admiração. Leitora compulsiva teve na literatura mais que a sua outra pátria o lugar da própria vida.




“(…)Trago sempre o Rilke à baila. É tão estranho, ele era um homem frágil e escreveu muita da sua obra dentro dos muros dos castelos hospitaleiros e talvez tivesse ficado completamente destroçado em circunstâncias com aquelas em que vivemos actualmente. Mas não demonstrará boa economia que, em épocas tranquilas e em circunstâncias favoráveis, artistas sensíveis possam procurar livremente as formas mais belas e adequadas para as suas convicções mais profundas, que dão às pessoas em épocas mais agitadas e extenuantes um apoio e um abrigo para confusões e perguntas que ainda não tomaram uma forma e uma solução próprias, porque as energias diárias são reclamadas pelas aflições diárias? Em tempos difíceis as pessoas têm o costume de, com um gesto desprezível, deitar fora as conquistas espirituais de artistas das chamadas épocas fáceis (ser artista é em si mesmo já é bastante difícil, não é?), com o acrescento: Para que é isso nos serve?” 
Talvez seja compreensível, mas é tacanho. E infinitamente empobrecedor.(…)”


Os livros encerram em si a vida que presenciaram e são eles que nos amparam quando tudo o resta nos falta. Cada livro será sempre um singular e certo abrigo. 


Bom ano para todos os leitores.

Que sejam tal como Etty se afirmava: depositários de preciosos fragmentos de vida, responsáveis pelo sentimento grande e belo que a vida inspira e pelo dever de o tentar transportar intacto através desta época para atingir melhores dias.

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