sexta-feira, 16 de agosto de 2013

QUE VIVA MÉXICO




A América Latina tem 7 grandes literaturas, muito fortes e muito diferenciadas. A Chilena, a Argntina e Uruguaia, a Brasileira, a Peruana, a Colombiana, a Cubana e a Mexicana. E estarei a deixar de fora outras que quase desconheço como a guatemala, as Honduras, etc.

Nada mais errado, portanto, do que falar de uma única literatura sul-americana.

A violência da História e da actualidade do México tem levado a que os seus escritores nos tragam um olhar duro, uma escrita intensa e violenta, que nos faz tremer perante a ficção que se reporta a um mundo pintado em tintas fortes como a pintura de Diego Rivera ou Frida Kahlo.

Há grandes nomes de romancistas e poetas mexicanos não tão conhecidos em Portugal como mereceriam. Podemos brevemente referir Juan Rulfo e o seu extraordinário "Pedro Páramo" (publicado pela Cavalo de Ferro) ou o exclente poeta José Emílio Pacheco que creio não ter traduções em Portugal.

O meu amigo Marcelo Teixeira (agora na Parsifal) quando trabalhava na Oficina do Livro deu-nos a conhecer clássicos e jovens escritores mexicanos (e não só mexicanos) na magnífica colecção "Ovelha Negra" que, infelizmente, já deixou de se publicar.

Entre os grandes da literatura mexicana está Carlos Fuentes, falecido em 2012, premiadíssimo, várias vezes apontado ao Prémio Nobel, e com bastantes títulos publicados em Portugal mas não muito referido pela nossa imprensa cultural.

Carlos Fuentes sempre falou de dentro da terra mexicana, do sentir dos homens e mulheres do México e, por isso mesmo, sempre se mostrou capaz de estabelecer as pontes entre o seu país e o mundo, tornando-se assim na figura paradigmática do escritor universal.

Estes "Contos Naturais" constituem uma pequena antologia da sua vasta obra como contista (para além da obra como romancista). São contos escritos em épocas diferentes e que nos dão uma visão rápida mas intensa sobre a arte de Fuentes no que diz respeito ao conto.

O primeiro conto, "Velha moralidade", é uma pérola que nos dá a arte de Carlos Fuentes em toda a sua plenitude.

A figura central,o avô do narrador, velho libertário e, sobretudo, anti-clericalista furioso, entretén-se a insultar os padres que têm todos os dias de passar junto às suas terras.

Amante da terra, das mulheres, do vinho, sem nenhum pejo nem véus vai passando esses valores de forma absoluta e algo selvagem ao neto.

Torna-se assim no alvo da malediciência e das críticas do povoado e, em primeiro lugar, das tias que lhe vão arrancar o neto para lhe dar uma "educação como deve ser".

O neto vai descobrir insuspeitas facetas no mundo que lhe é proporcionado pelas tias. E no choque entre os dois mundos
acaba por hesitar saem saber como fazer uma escolha.

É de forma brilhante que Fuentes dá a volta às aparências e nos revela obscuras perversidades que nos levam a olhar as coisas de maneira muito diferente das aparências.

Os 6 contos pertencem não só a épocas diferentes mas também a diferentes ambientes desde o mundo rural e dos pequenos pueblos até às cidades da fronteira com os EUA, a fronteira de vidro, onde se instalam fábricas de acessórios diversos, autênticos locais de escravatura, onde os patrões podem dispensar as leis do trabalho do país vizinho e pagar ninharias aos pobres trabalhadores que vivem na quase miséria, e onde a violência é o pão nosso de cada dia

O sexo, a igreja, as memórias da revolução são outros temas que sobressaem destas belas narrativas e que nos trazem uma visão multifacetada sobre este país tão diverso, lugar de um imaginário explosivo, escaldante, louco e tão cheio de humanidade.

Ler Carlos Fuentes é perceber como o nosso mundo é feito de muitas faces e compreender mais claramente que se alguém sofre do outro lado do mundo eu não lhe posso estar indiferente porque, afinal de contas, todos somos vizinhos deste pobre planeta.


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